Os salva vidas dividem o salvamento aquático em cinco fases: a identificação da vítima, aproximação/deslocamento, abordagem, resgate/reboque e os primeiros socorros. Para estas etapas, os salva vidas baianos estão utilizando uma técnica pioneira: adaptação dos conhecimentos do Jiu-jitsu para o desvencilhamento e resgate de vítimas. O objetivo é evitar traumas nas vítimas no momento da abordagem, quando, normalmente, elas estão desesperadas.
Essa técnica, que possui algumas similaridades com o Judô Aquático, está sendo praticada desde 2010 pelos agentes de salvamento aquático da Bahia e, para utilizá-la, eles passam por treinamentos com professores especializados. Já aconteceram treinos intensivos em 2010, 2011 e 2013. Primeiro, ela é ensinada e praticada em terra firme em duplas, nos tatames, em áreas abertas, e na areia da praia. Depois os conhecimentos são testados e vivenciados na piscina com a água na altura do peito. Nas etapas finais, são realizados simulados no mar, em locais mais profundos.
“A adaptação do Jiu-jitsu para o uso na água é mais suave, com ela, nós não precisamos forçar as articulações da vítima na hora do salvamento, imobilizando-as sem torções ou projeções que as lesionem – o que poderia caracterizar uma Iatrogenia (técnica mal empregada pelo profissional de saúde durante o socorro). Para chegar nesse ponto, estudei muito e desenvolvi, com a colaboração de colegas com mais de 25 anos de experiência na área, uma metodologia para passar esse conhecimento adiante. Além dos agentes de Salvador, já participaram dos nossos treinamentos salva vidas de Lauro de Freitas, Camaçari e do Grupamento Marítimo (GMAR) da Bahia”, explicou o salva vidas Jou Oliveira, faixa preta em Jiu-jitsu e idealizador da adaptação para o mar.
Ele conta que, mesmo sem querer, por causa do desespero, as pessoas quando se afogam agarram os ombros, a cintura, puxam os cabelos, o uniforme, o cordão do apito e seguram nos salva vida como podem, pois querem um ponto de apoio para emergir e respirar. “Isso, se o profissional não souber usar a prática corretamente, pode levar os dois ao afogamento e, se o pior acontecer, à morte. Dentro da água tudo pode mudar, pois aquilo ali é um mundo. Por isso, é importante que o salva vidas faça a leitura do salvamento à distância, com rapidez, se antecipe ao ‘ataque’ e seja preciso na hora de colocar em prática as táticas que usará para salvar a vítima, pois precisamos preservar a integridade delas ao máximo”, adverte o agente de salvamento aquático.
Segundo Oliveira, por ser mais precisa, a técnica ajuda na economia de energia e proporciona uma vida mais saudável para os profissionais que a utilizam, pois os salva vidas não precisam repetir os movimentos diversas vezes no momento da abordagem e do reboque das vítimas em segurança, como ocorria no Judô Aquático, no qual o afogado em desespero era projetado quantas vezes fossem necessárias pelo salva vidas até que o mesmo se sentisse seguro para abordá-la, e assim efetuar o reboque com a vítima mais calma ou inconsciente, agravando a sua situação.
Na própria pele
“Eu e minha prima, que é como se fosse uma irmã pra mim, estávamos brincando de pular ondinhas e flutuar no mar de Stella Mares. Como eu moro lá, e frequento a praia há algum tempo, sei que no meio do mar tem pedras onde conseguimos ficar em pé, mas a minha prima, que é de Curitiba, não sabia. A maré subiu e não prestamos atenção. Ela já não estava mais dando pé, por causa de um desnível. Ela me olhou e começou a ficar com uma feição de terror. Nessas horas, os minutos parecem uma eternidade, o tempo congela, o pânico não nos deixa raciocinar, e eu não lembrei das pedras e do desnível, onde ela poderia ficar de pé e se acalmar. Eu, como sei nadar, pedi para ela fechar a boca para não entrar água e se manter calma, pois eu ia nadar e chamar os salva vidas que estavam na praia. Mas, graças a Deus, quando eu levantei os braços e ia nadar para buscar ajuda, vieram dois anjos, dois salva vidas, nos socorrer”, narra a educadora Gabriela Pereira, 29 anos. Segundo ela, mesmo sabendo nadar, ela não teria como salvar a prima, pois estava em estado de choque.
“Os salva vidas que nos socorreram naquele dia 27 de março, Jou Oliveira e André Ferreira, utilizaram técnicas que não nos machucaram e ainda nos deram segurança para conter o desespero. Deveria haver um posto com esses profissionais a cada 500 m e em todas as praias de Salvador, para nunca ninguém morrer afogado pela falta deles. Não tenho palavras para agradecer o que eles fizeram pela gente, eles são anjos em forma de homens. Sempre que posso, falo com eles. Construímos uma amizade”, acrescenta Gabriela. Ela é uma das centenas de vítimas salvas pelos agentes de salvamento aquáticos baianos através das técnicas adaptadas do Jiu-jitsu.
Com o apoio do Sindseps e da Associação Baiana de Salvamento Aquático (Abasa), os salva vidas têm lutado por melhores condições de trabalho e pela valorização da profissão. “São trabalhadores que merecem o respeito e o reconhecimento da gestão municipal. Eles salvam vidas, mas correm risco de perder a deles pela falta de estrutura. Além disso, não contam com assistência à saúde, assim como a maioria de nós servidores, e ganham um salário que é uma vergonha! Junto com a Abasa, nós continuaremos na luta por mais dignidade para os salva vidas baianos, esses homens de muita coragem e dedicação”, destacou o diretor do Sindseps Helivaldo Alcântara.
*Colaboração do salva vidas Heron Capinan para a simulação